Guias Arte 365

Hegel (1770 – 1831) e a morte da arte #estetica

No semestre de verão de 1803, Hegel anunciou que apresentaria toda a filosofia como um sistema. A partir de então, referiu-se repetidamente à sua “Enciclopédia das ciências filosóficas”, uma espécie de simples cartilha acadêmica. Mas ao invés disso criou uma obra robusta que mudou para sempre a filosofia.

Para entender a forma de pensar de Hegel

Como chegou até nós as lições de Hegel sobre estética

O tema do suposto fim da arte preconizado por Hegel, aparece em suas “Lições sobre estética” pronunciadas na Universidade de Berlim.

Mas o filósofo alemão não escreveu um livro baseado nessas aulas, o que temos à nossa disposição é uma compilação das notas realizadas por seu aluno – Heinrich Gustav Hotho (1802 – 1873), as quais se editaram após a morte de Hegel.

Portanto, essas notas sequer foram revisadas pelo autor. Nas teses desenvolvidas nessas aulas, a arte ganha um lugar próprio, mas nem sempre ele pensou dessa forma.

Na sua produção anterior, a arte aparecia como um sub-produto da religião, ou seja, não como um sistema ou campo autônomo. Ele havia afirmado que devido seu imediatismo,

“a arte é uma expressão inadequada para a captação e realização do espírito, pelo que ao invés de expor a verdade, é o véu que a encobre”.

Hegel e a morte da arte

Hegel e o fim da arte Quando Hegel fala de religião da arte faz referência aos artesãos egípcios, que realizavam um trabalho instintivo, mas sem liberdade. Já em Grécia, o artesão tem consciência de sua criatividade e se converte em artista. Importante, que quando ele fala de arte, não trata apenas das artes visuais, mas também do teatro grego.

Para ele, é na Grécia que a arte ganha subjetividade. De certa forma, Hegel afirma que o homem perdeu a alma e necessitou reencontrá-la em algo fora dele, precisou transcender, ao que dá o nome de Deus, e aí passamos ao que chamou de “religião revelada”.

Lições sobre estética

Hegel começou a desenvolver o curso conhecido como “Lições sobre Estética” a partir de 1817, ministrando-o a partir de 1818, mas trabalhou sobre o conteúdo até 1828.

Hotho esteve presente nos cursos de 1823 e de 1826. E o aluno passará a professor de Estética e História da Arte na mesma universidade, a partir de 1829.

Além de ter frequentado o curso de Hegel, Hotho teve acesso aos cadernos de Hegel e dizem que também empregou notas de outros 8 alunos para redatar o texto final.

Apesar da problemática de usar tanto “copia e cola”, Hotho teve um um ponto de apoio sólido nos parágrafos 556 a 563 da “Enciclopédia das ciências filosóficas”, de Hegel.

Hegel e os 3 estágios da arte

Hegel - Lições sobre estética Nesses parágrafos, ele apresenta as épocas fundamentais da arte (simbólica, clássica e romântica) e depois mostra como os distintos gêneros artísticos (arquitetura, escultura, pintura, música e poesia) se ajustam à história da arte.

Quando dá autonomia à arte, Hegel afirma que ela apresenta o absoluto no elemento da intuição e não da reflexão, que seria trabalho da filosofia:

“O fim da arte é a exposição sensível do absoluto”.

Essa exposição estaria marcada por um lado pela perspectiva histórica, já que todo obra pertence a seu tempo, povo e entorno.

E portanto, seria necessário criar uma sistematização da história da arte. Nesse ponto, o filósofo desdobra a história da arte em arte simbólica, que corresponderia à arte oriental pré-clássica e que para ele se constitui no “pré-artístico”, ou seja, quando a arte é um sub-produto da religião. Como uma substância sem sujeito.

Nesse primeiro momento, a arquitetura se destaca frente outras linguagens.
Hegel e o fim da arte

Arte Clássica

Num segundo momento temos a arte clássica e que corresponde à arte grega,

“quando existe uma perfeita unidade entre forma e conteúdo”.

Uma arte onde se manifesta a intuição genuína da beleza.

Essas ideias de Hegel estão diretamente relacionadas com aquelas expressas por um dos grandes historiadores da arte do século 18 – Winckelman. Ele foi o primeiro a estabelecer diferenças entre arte grega, arte greco-romana e arte romana.

Mas não pense que para Hegel, beleza e arte sempre iam de mãos dadas. Ele sabia que nem todos os produtos artísticos de outras culturas e momentos históricos podem manter essa variante. Isso se tornou essencial na cultura grega quando aconteceu a antropomorfização dos deuses. Essa humanização para Hegel constituiu a forma mais pura do que seria a ideia espiritual.

“(…) entre os gregos, a arte era a forma suprema na qual o povo representava aos deuses e se tornava consciente dessa verdade. Portanto, para os gregos, os poetas e artistas se converteram nos criadores de seus deuses, ou seja, os artistas materializaram à nação”.

No período clássico, o destaque é a escultura.
Hegel e o fim da arte

Arte Romântica

Se por um lado, a antropomorfização dos deuses é um aspecto quase  mágico, por outro,  ele sabe que esse mesmo aspecto levaria a morte da arte.  Porque essa beleza mostra uma mera conciliação superficial entre conteúdo espiritual e forma sensível, mas não traz à tona toda a profundidade do espírito.

E para ele, é essa precária unidade, dada sua superficialidade, que traz a decadência para o mundo grego. Portanto, quando fala em morte da arte, mas bem parece que fala da morte dos sistemas da arte, que dão espaço para novas formas de fazer e entender a arte.

E esse declive, abre espaço para o romantismo, onde novamente se separa forma e conteúdo. Se retorna a arte simbólica? Não, porque aqui o desequilíbrio nasce com o artista, ou é imposto por ele. E se impõe a arte grega porque adquire conteúdo espiritual, é a arte do cristianismo. A arte de um “deus” que se sacrifica pela humanidade. Uma arte que traslada o culto ao belo da arte clássica para a exaltação do ânimo e da interioridade que domina a expressão subjetiva.

No período romântico, o destaque é a pintura e a música.
Hegel e o fim da arte

Portanto, não é que para ele, a arte acabasse como romantismo, mas ele termina com seu tempo, porque não podia adiantar o que levaria os artistas a duvidar da própria arte no começo do século 20.

Resumindo, falamos da ideia que uma época morre e cede à outra, o protagonismo. Portanto, falamos de uma morte relativa da arte.

Para saber mais em português

Destaque para a coleção da Edusp, em 4 volumes de “Lições de Estética”.