Guias Arte 365

“Natureza-morta com louça e doces” (c. 1627) de Juan van der Hamen y León

O tema da natureza-morta foi bastante explorado pelo barroco, aliás a primeira pintura desse gênero teria sido realizada por Caravaggio em 1599 (“Cesto de fruta”).

Rapidamente, os artistas se fizeram com o gênero. Tanto que, o artista espanhol Juan van der Hamen y León (1596 – 1631) alcançou a fama com suas naturezas-mortas.

Natureza-morta com louça e doces

Em “Bodegón con loza y dulces”, nas laterais temos louças e ao centro uma porção de doces.

As peças de cerâmica revelam o passado colonialista espanhol. Porque além do extrativismo de matérias-primas, os colonizadores também se apropriavam de bens culturais, como essas louças Tonalá.

Essa cerâmica produzida em Jalisco (México) nasce antes da invasão, bebe da cultura hispânica, mas conserva seu legado ancestral.

Os europeus enlouqueceram com essas louças que tinham aroma, tanto que eram muito usadas para água, porque impregnavam a água com um cheiro e sabor agradáveis. Sem contar que pelas propriedades do barro e sua porosidade, mantinham os líquidos frescos.

Por tudo isso, a nobreza espanhola consumiu massivamente essas peças. Descobri algo bem maluco, as mulheres comiam pedaços dessas cerâmicas porque aparentemente ajudavam a emagrecer. E ainda,  tornar a tez mais branca.

Essa prática é conhecida como “bucarofagia” e começou por essa época e foi algo comum até o século 19! Pensa na bucarofagia como uma dessas dietas milagrosas. Sim, é horrível, mas não são todas assim?

Essas peças de barro queimado provocavam “clorosis”, uma diminuição de glóbulos vermelhos no sangue, e por isso, geravam essa palidez, tão almejada pelas damas da corte.

Lope de Vega, um dos poetas e novelistas mais importantes do Século de Ouro espanhol, escreveu em 1608 a peça cômica “No aço de Madri”:

“Menina de cor quebrada, ou você tem amor ou come barro.”

Os médicos tentaram erradicar essa prática, mas como sempre esses cânones absurdos de beleza se impõem, mesmo que prejudiquem a saúde das mulheres.

Percebe tudo que nos conta essa obra? E pensar que normalmente, costumamos apenas passar os olhos por essas pinturas de naturezas-mortas.

“Natureza morta com louça e doces” (c. 1627)
De Juan van der Hamen y León
Óleo sobre tela | 77,4 x 100,6 cm
Museo Nacional Thyssen-Bornemisza, Madrid

Arte e colonialismo

Se você se interessa sobre esse tema, recomendo esse passeio comigo pela exposição “A memória colonial na Coleção do Museu Thyssen”.